Tuesday, August 26, 2003

Os Upanishads
Sabedoria proveniente das florestas

Upanishad Brihad-Aranyaka

PRIMEIRO ADHYAYA – QUARTO BRAHMANA

1. No início isto era somente Ser, na forma de uma pessoa (purusha). Ao olhar em redor, não viu nada que não fosse o seu Ser. Primeiro disse: ‘Isto é (sou) eu’, portanto passou a chamar-se “eu”.
Portanto, mesmo agora, quando se chama um homem, ele diz em primeiro lugar ‘Isto sou eu’, e depois pronuncia o outro nome que possa ter. E porque antes de tudo isto ele (o Ser) queimou todos os males, então conclui-se que ele era uma pessoa (purusha). Na verdade, aquele que sabe isto queima todos aqueles que tentam ser antes dele.

2. Ele teve medo e, portanto, todo aquele que está só tem medo. Ele pensou, ‘como não existe nada a não ser eu próprio, porquê ter medo?’ Assim, este medo desapareceu. De que é que ele deveria ter medo? Na verdade o medo só surge devido à existência de uma segunda entidade.

3. Mas ele não sentiu prazer. Portanto, um homem que está só não sente prazer. Ele desejou uma segunda entidade. Ele era tão grande como marido e mulher juntos. Ele fez então este seu Ser precipitar-se em dois, e assim surgiram marido e mulher. Portanto, Yagnavalkya disse: ‘Nós os dois (cada um de nós) somos portanto como a metade de uma concha.’ Assim, o vazio que ali existia é preenchido pela mulher. Ele abraçou-a e nasceram os homens.

4. Ela pensou. ‘Como é que ele me pode abraçar, depois de me ter produzido a partir dele mesmo? Eu vou esconder-me.’

Ela tornou-se então uma vaca, o outro tornou-se um boi e abraçou-a, e desde então nasceram as vacas. Uma tornou-se uma égua, o outro, um cavalo; um, um burro, o outro, uma burra. Ele abraçou-a e então nasceram os animais de um casco. Um tornou-se uma fêmea cabra, o outro, um macho bode; um tornou-se uma ovelha, o outro, um carneiro. Ele abraçou-a e então nasceram cabras e bodes, ovelhas e carneiros. E portanto ele criou tudo o que existe em pares, até chegar às formigas.

5. Ele soube ‘eu sou, na verdade, esta criação, pois eu criei tudo isto’. Assim ele tornou-se a criação, e aquele que sabe isto vive nisto a sua criação.

6. Depois ele prosseguiu e criou fogo através da fricção. A partir da boca, como a partir do buraco do fogo, e a partir das mãos, ele criou fogo. Portanto, tanto a boca como as mãos não têm ar no interior, pois o buraco do fogo não tem ar no seu interior.

E quando dizem, ‘Façam sacrifício a isto ou façam sacrifício àquele deus’, cada deus não é senão a sua manifestação, pois ele é todos os deuses.

Agora, o que quer que tenha suco, isso foi ele que criou a partir da semente; isso é Soma. Porque, na verdade, este universo é ou comida ou comedor. Soma, na verdade, é comida, Agni comedor. Esta é a criação mais alta de Brahman, criar os deuses da sua melhor parte e criar os imortais quando ele, então, era mortal. Portanto, foi a mais alta criação. E aquele que sabe isto vive nesta mais alta criação.

7. Então tudo isto estava por desenvolver. Tornou-se desenvolvido através da forma e do nome, para que se pudesse dizer, ‘Ele, chamado isto e isto, é uma tal entidade. ‘Portanto, também no presente, tudo isto se desenvolve através de nome e forma, para que se possa dizer, ‘Ele, chamado isto e isto, é uma tal entidade.’

Ele (Brahman ou o Ser) entrou para lá, para a ponta das unhas dos dedos, como uma navalha se guarda na sua caixa, ou o fogo na fogueira.

Ele não se consegue ver, pois, apenas em parte, ao respirar, ele toma o nome de respiração; ao falar, o nome de fala; ao ver, o nome de olho; ao ouvir, o nome de ouvido; ao pensar o nome de mente. Todos estes são apenas nomes dos seus actos. E aquele que o contempla enquanto um ou outro não o conhece, porque ele está separado daquilo que é qualificado como um ou outro predicado. Que os homens o contemplem como Ser pois, no Ser, todos eles são um. Este Ser é a pegada de tudo pois, através d’Ele, tudo sabemos. E tal como podemos voltar a encontrar o que perdemos através das pegadas, também aquele que sabe isto encontra glória e louvor.

8. Isto, que está mais próximo de nós que qualquer outra coisa, este Ser, é mais querido que um filho, mais querido que a riqueza, mais querido que tudo o resto.

E se não dissermos a alguém, que declara querido outra coisa que não o Ser, que desse modo perderá o que lhe é querido, isso acabará muito provavelmente por acontecer. Ele que preste culto apenas ao Ser, como coisa querida. Para aquele que adora somente o Ser como coisa querida, o objecto do seu amor nunca perecerá.

9. Diz-se por aqui: ‘Se os homens pensam que, através do conhecimento de Brahman, eles se tornarão em tudo, o que é que, então, Brahman conhecia, de que lugar é que tudo isto brotou?’

10. Em verdade, no início isto era Brahman, o que esse Brahman conhecia era apenas o (seu) Ser, dizendo, ‘Eu sou Brahman’. Daqui tudo isto brotou. Assim , qualquer que fosse o Deva que fosse desperto (com o objectivo de conhecer Brahman), ele tornava-se de facto nesse Brahman; e o mesmo se passava com os Rishis e com os homens. O Rishivamadeva viu e compreendeu-o, cantando, ‘Eu era Manu (Lua), eu era o Sol’. Portanto, agora também aquele que sabe que é Brahman torna-se nisto tudo, e nem mesmo os Devas o podem evitar, já que ele próprio é o Ser deles.

Assim, se um homem presta culto a outra divindade, pensando que a divindade é uma e ele outro, ele não sabe. Ele é como um monstro para os Devas. Pois tal como muitos monstros, na verdade, alimentam um homem, também todos os homens alimentam os Devas. Se quando apenas um monstro é retirado não é agradável, quão mais não será quando são retirados muitos! Portanto, não é agradável para os Devas que os homens saibam isso.

11. Na verdade, no início isto era Brahman, um apenas. Esse ser um não era suficientemente forte. Ele foi mais além e criou o mais excelente Kshatra (poder) face aos Kshatras entre os Devas, Indra, Varuna, Soma, Rudra, Parganya, Yama, Mrityu, Isana. Portanto não há nada para além do Kshatra, e, portanto, no sacrifício do Ragasutya o Brahmana senta-se a baixo do Kshatriya. Ele confere essa glória ao Kshatra apenas. Mas Brahman é, no entanto, o local de nascimento do Kshatra. Assim, embora um rei seja exaltado, ele senta-se no fim (do sacrifício) a baixo do Brahman, de acordo com a sua posição de nascimento. Aquele que o injuria, injuria a sua posição de nascimento. Ele torna-se pior porque injuriou um melhor que ele próprio.

12. Ele não foi suficientemente forte. Ele criou os Vis (pessoas), as classes de Devas que, nas suas diferentes ordens, são chamadas Vasus, Rudras, Adityas, Visve Devas, Maruts.
13. Ele não foi suficientemente forte. Ele criou a cor do Sudra (casta) como Pushan (como alimentador). Esta terra é na verdade Pushan (o alimentador); porque a terra alimenta tudo isto, o que quer que seja.

14. Ele não foi suficientemente forte. Ele criou ainda mais a Lei de maior excelência (dharma). Lei é o Kshatra (poder) dos Kshatra, portanto não há nada mais elevado que a Lei. Assim sendo, até um homem fraco manda como um forte com a ajuda da Lei, tal como com a ajuda de um rei. Assim, a Lei é denominada a verdade. E se um homem declarar o que é verdade, diz-se que declara a Lei; e se ele declara a Lei, diz-se que declara o que é verdade. Assim, ambas são o mesmo.

15. Existem, assim, este Brahman, Kshatra, Vis, e Sudra. Entre os Devas esse Brahman existia como Agni (fogo) apenas, entre os homens, como Brahmana, como Kshatriya entre os (divinos) Kshatriya, como Vaisya entre os (divinos) Vaisya, como Sudra entre os (divinos) Sudra. Portanto as pessoas expressam o seu desejo quanto ao seu estado futuro entre os Devas através de Agni (o fogo sacrificial) apenas; e, entre os homens, através do Brahmana, pois Brahman existe nestas duas formas.

Portanto, se um homem parte desta vida sem ter visto a sua verdadeira vida futura (no Ser), então esse Ser, não sendo conhecido, não o recebe nem o abençoa, como se o Veda não tivesse sido lido, ou como se uma boa acção não tivesse sido praticada. E também, mesmo que uma pessoa que não conhece Aquilo (Ser) realizasse aqui na terra um santo e grande trabalho, esse trabalho morreria para ela no fim. Que um homem adore somente o Ser, enquanto seu verdadeiro estado. Se um homem adorar somente o Ser, enquanto seu verdadeiro estado, o seu trabalho não morre, pois tudo o que ele desejar ele obterá desse Ser.

16. Assim, na verdade, este Ser (do homem ignorante) é o mundo das criaturas todas. Na medida em que o homem realiza sacrifícios e oferece libações, ele é o mundo dos Devas; na medida em que repete hinos, etc., ele é o mundo dos Rishis; na medida em que oferece bolos aos pais, e tenta obter descendência, ele é o mundo dos pais; na medida em que dá abrigo e comida aos homens, é o mundo dos homens; na medida em que providencia forragens e água para os animais, é o mundo dos animais; na medida em que quadrúpedes, aves e até formigas vivem nas suas casas, é o seu mundo. E tal como toda a gente deseja que o seu próprio mundo não seja injuriado, também todos os seres desejam que aquele que sabe isto não seja injuriado. Na verdade, isto é conhecido e foi bem pensado.

17. No início isto era Ser somente, um apenas. Ele desejou, ‘Que haja para mim uma esposa de quem tenha descendência, e que haja riqueza material para mim para que possa oferecer sacrifícios’. Na verdade, este é todo o desejo e, mesmo que desejasse mais coisas, não as encontraria. Portanto, agora também uma pessoa solitária deseja,’ Que haja para mim uma esposa de quem tenha descendência, e que haja riqueza material para mim para que possa oferecer sacrifícios’. E caso não obtenha nenhuma destas coisas, ele pensa que está incompleto. Assim, o seu estar completo (compõem-se do seguinte): a mente é o seu ser (marido); a fala, a mulher; a respiração, os filhos; o olho, toda a riqueza mundana, pois que ele a encontra com o olho; o ouvido, a sua riqueza divina, pois ele a ouve com o ouvido. O corpo (atman) é o seu trabalho, pois que é com o seu corpo que trabalha. Este é o sacrifício de cinco partes, pois cinco partes constituem o animal, cinco partes o homem, cinco partes tudo o resto. Aquele que sabe isto obtém tudo isto.






SEGUNDO ADHYAYA - TERCEIRO BRAHMANA

1. Há duas formas de Brahman, a material e a imaterial, a mortal e a imortal, a sólida e a fluida, sat (ser) e tya (aquilo ou isso), (i.e. sat-tya, verdade).

2. Tudo, excepto o ar e o céu, é material, é mortal, é sólido, é definido. A essência daquilo que é material, que é mortal, que é sólido, que é definido, é o sol que brilha, porque ele é a essência de sat (o que é definido).

3. Mas o ar e o céu são imateriais, são imortais, são fluidos, são indefinidos. A essência daquilo que é imaterial, que é imortal, que é fluido, que é indefinido é a pessoa no disco do sol, porque ela é a essência de tyad (o que é indefinido). Isto no que diz respeito aos Devas.

4. Agora, no que respeita ao corpo. Tudo, excepto a respiração e o éter, no interior do corpo, é material, é mortal, é sólido, é definido. A essência daquilo que é material, que é mortal, que é sólido, que é definido, é o Olho, porque ele é a essência de sat (o que é definido).

5. Mas a respiração e o éter no interior do corpo são imateriais, são imortais, são fluidos, são indefinidos. A essência daquilo que é imaterial, que é imortal, que é fluido, que é indefinido, é a pessoa que está no olho direito porque ela é a essência de tyad (o que é indefinido).

6. E qual é a aparência dessa pessoa? É como uma veste cor de açafrão, como a lã branca, como cochonilha, como a chama do fogo, como o lotus branco, como o repentino trovejar. Aquele que sabe isto, a sua glória é como se estivesse no repentino trovejar.
Segue-se o ensinamento (de Brahman) através da negação, do não! Porque não há nada mais alto do que (dizer-se) isto: ‘não é assim’. Depois vem o nome ‘a Verdade da Verdade’, em que os sentidos são a Verdade e ele (Brahman) a Verdade deles.





SEGUNDO ADHYAYA - QUARTO BRAHMANA

1. Agora, quando Yagnavalkya ia entrar num outro estado, disse: 'Maitreyi, na verdade eu vou deixar esta minha casa (e vou para a floresta). Assim, deixai-me fazer um acordo entre vós e aquela Katyayani (a minha outra mulher)’.

2. Maitreyi disse: ‘Meu Senhor, se toda esta Terra, cheia de riqueza, me pertencesse, dizei-me, seria eu imortal por causa disso?’
‘Não’, respondeu Yagnavalkya; ‘a vossa vida será como a vida das pessoas ricas. Mas não há esperança de imortalidade através da riqueza material.’

3. E Maitreyi disse: ‘De que me vale algo através do qual eu não me torno imortal? O que sabeis, meu Senhor (sobre a imortalidade), dizei-mo agora’.

4. Yagnavalkya respondeu: ‘Vós que me sois verdadeiramente querido, vós falais palavras queridas. Vinde, sentai-vos, explicar-vos-ei, e tomai boa nota do que eu digo’.

5. E ele disse: ‘Na verdade, um marido não é querido, por ser amado como marido; mas é por se amar o Ser que um marido é querido.
‘Na verdade, uma esposa não é querida, por ser amada como esposa; mas é por se amar o Ser que uma esposa é querida.
‘Na verdade, os filhos não são queridos, por serem amados como filhos; mas é por se amar o Ser que os filhos são queridos.
‘Na verdade, a riqueza material não é querida, por ser amada como riqueza material; mas é por se amar o Ser que a riqueza material é querida.
‘Na verdade, a casta dos Brahmanes não é querida, por ser amada como casta de Brahmanes; mas é por se amar o Ser que a casta dos Brahmanes é querida.
‘Na verdade, a casta dos kshatryas não é querida, por ser amada como casta dos kshatryas; mas é por se amar o Ser que a casta dos kshatryas é querida.
‘Na verdade, os mundos não são queridos, por serem amados como mundos; mas é por se amar o Ser que os mundos são queridos.
‘Na verdade, os Devas não são queridos, por serem amados como Devas; mas é por se amar o Ser que os Devas são queridos.
‘Na verdade, as criaturas não são queridas, por serem amadas como criaturas; mas é por se amar o Ser que as criaturas são queridas.
‘Na verdade, tudo não é querido, por ser amado como tudo; mas é por se amar o Ser que tudo é querido.
‘Na verdade o Ser é para ser visto, para ser ouvido, para ser percebido, para ser marcado, oh, Maitreyi! Quando tivermos visto, ouvido, percebido, e conhecido o Ser, então tudo isto será conhecido’.

6. ‘Quem quer que procure a casta dos Brahmanes em qualquer outro lugar que não seja o Ser, foi abandonado pela casta dos Brahmanes. Quem quer que procure a casta dos Kshatrya em qualquer outro lugar que não seja o Ser, foi abandonado pela casta dos Kshatrya. Quem quer que procure os mundos em qualquer outro lugar que não seja o Ser, foi abandonado pelos mundos. Quem quer que procure os Devas em qualquer outro lugar que não seja o Ser, foi abandonado pelos Devas. Quem quer que procure as criaturas em qualquer outro lugar que não seja o Ser, foi abandonado pelas criaturas. Quem quer que procure alguma coisa em qualquer outro lugar que não seja o Ser, foi abandonado por tudo. Esta casta dos Brahmanes, esta casta dos kshatryas, estes mundos, estes Devas, estas criaturas, este tudo, tudo é esse Ser’.

7. ‘Agora, como os sons de um tambor, quando tocado, não podem ser medidos exteriormente (por eles próprios), sendo antes o som medido, medindo o tambor, ou através do tocador do tambor;’

8. ‘E tal como os sons de uma concha, quando soprada, não podem ser medidos exteriormente (por eles próprios), sendo antes o som medido, medindo a concha, ou através do tocador da concha;’

9. ‘E tal como os sons de um alaúde, quando tocado, não podem ser medidos exteriormente (por eles próprios), sendo antes o som medido, medindo o alaúde, ou através do tocador de alaúde;’

10. ‘Como nuvens de fumo, que se sucedem vindas de um fogo ateado com combustível húmido, também, na verdade, oh, Maitreyi, foi soprado a partir deste grande Ser o que temos como Rig-Veda, Yagur-veda, Sama-veda, Atharvangirasas, Itihasa (legendas), Purana (cosmogonias), Vidya (conhecimento), os Upanishads, Slokas (versos), Sutras (aforismos), Anuvyakhyanas (glosas), Vyakhyanas (comentários). Dele apenas todos estes foram soprados’.

11. Tal como todas as águas encontram o seu centro no mar, todos os toques, na pele, todos os gostos, na língua, todos os cheiros, no nariz, todas as cores, nos olhos, todos os sons, nos ouvidos, tudo o que é percebido, na mente, todo o conhecimento, no coração, todas as acções, nas mãos, todos os movimentos, nos pés, e todos os Vedas na fala,

12. ‘Tal como um pedaço de sal, quando deitado à água, fica dissolvido na água, e não poderia ser retirado de novo, mas, onde quer que provemos (a água), é sal, - assim, na verdade, oh, Maitreyi, este grande Ser, que não tem fim, é ilimitado, consiste em nada que não seja conhecimento, se ergue para fora destes elementos, e desaparece de novo neles. Depois de ter partido, não há mais conhecimento (nome), Eu o digo, oh, Maitreyi.’
Assim falou Yagnavalkya

13. Então Maitreyi disse: ‘Aqui vós confundistes-me, oh, Senhor, quando dissesteis que, tendo partido, não há mais conhecimento’.
Mas Yagnavalkya respondeu: 'Oh, Maitreyi, eu não digo nada que faça confusão. Isto é suficiente, oh, adorado, como sabedoria.
Porque quando aparentemente existe dualidade, então vemos o outro, cheiramos o outro, ouvimos o outro, saudamos o outro, percebemos o outro, conhecemos o outro; mas quando só o Ser é tudo isto, como poderia cheirar outro, como poderia ver outro, como poderia ouvir outro, como poderia saudar outro, como poderia perceber outro, como poderia conhecer outro? Como é que poderia conhecer Aquele pelo qual conhece tudo isto?
Como, oh, Amado, poderia conhecer-Se a Si próprio, o Conhecedor?






SEGUNDO ADHYAYA - QUINTO BRAHMANA

1. Esta Terra é o mel (madhu, o efeito) de todos os seres, e todos os seres são o mel (madhu, o efeito) desta Terra. Assim é esta pessoa brilhante e imortal nesta Terra, e aquela pessoa brilhante e imortal incorporada no corpo (ambas são madhu). Ela, de facto, é o mesmo que aquele Ser, aquele Imortal, aquele Brahman, aquele Tudo.

2. Esta água é o mel de todos os seres, e todos os seres são o mel desta água. Assim é esta pessoa brilhante e imortal nesta água, e esta pessoa brilhante e imortal que existe como semente no corpo, (ambas são madhu). Ela, de facto, é o mesmo que aquele Ser, aquele Imortal, aquele Brahman, aquele Tudo.

3. Este fogo é o mel de todos os seres, e todos os seres são o mel deste fogo. Assim é esta pessoa brilhante e imortal neste fogo, e esta pessoa brilhante e imortal que existe como fala no corpo, (ambas são madhu). Ela, de facto, é o mesmo que aquele Ser, aquele Imortal, aquele Brahman, aquele Tudo.

4. Este ar é o mel de todos os seres, e todos os seres são o mel deste ar. Assim é esta pessoa brilhante e imortal neste ar, e esta pessoa brilhante e imortal que existe como respiração no corpo, (ambas são madhu). Ela, de facto, é o mesmo que aquele Ser, aquele Imortal, aquele Brahman, aquele Tudo.

5. Este sol é o mel de todos os seres, e todos os seres são o mel deste sol. Assim é esta pessoa brilhante e imortal neste sol, e esta pessoa brilhante e imortal que existe como o olho no corpo, (ambas são madhu). Ela, de facto, é o mesmo que aquele Ser, aquele Imortal, aquele Brahman, aquele Tudo.

6. Este espaço é o mel de todos os seres, e todos os seres são o mel deste espaço. Assim é esta pessoa brilhante e imortal neste espaço, e esta pessoa brilhante e imortal que existe como o ouvido no corpo, (ambas são madhu). Ela, de facto, é o mesmo que aquele Ser, aquele Imortal, aquele Brahman, aquele Tudo.

7. Esta lua é o mel de todos os seres, e todos os seres são o mel desta lua. Assim é esta pessoa brilhante e imortal nesta lua, e esta pessoa brilhante e imortal que existe como mente no corpo, (ambas são madhu). Ela, de facto, é o mesmo que aquele Ser, aquele Imortal, aquele Brahman, aquele Tudo.

8. Este relâmpago é o mel de todos os seres, e todos os seres são o mel deste relâmpago. Assim é esta pessoa brilhante e imortal neste relâmpago, e esta pessoa brilhante e imortal que existe como luz no corpo, (ambas são madhu). Ela, de facto, é o mesmo que aquele Ser, aquele Imortal, aquele Brahman, aquele Tudo.

9. Este trovão é o mel de todos os seres, e todos os seres são o mel deste trovão. Assim é esta pessoa brilhante e imortal neste trovão, e esta pessoa brilhante e imortal que existe como som e voz no corpo, (ambas são madhu). Ela, de facto, é o mesmo que aquele Ser, aquele Imortal, aquele Brahman, aquele Tudo.

10. Este éter é o mel de todos os seres, e todos os seres são o mel deste éter. Assim é esta pessoa brilhante e imortal neste éter, e esta pessoa brilhante e imortal que existe como coração-éter no corpo, (ambas são madhu). Ela, de facto, é o mesmo que aquele Ser, aquele Imortal, aquele Brahman, aquele Tudo.

11. Esta lei (dharmah) é o mel de todos os seres, e todos os seres são o mel desta lei. Assim é esta pessoa brilhante e imortal nesta lei, e esta pessoa brilhante e imortal que existe como lei no corpo, (ambas são madhu). Ela, de facto, é o mesmo que aquele Ser, aquele Imortal, aquele Brahman, aquele Tudo.

12. Esta verdade (satyam) é o mel de todos os seres, e todos os seres são o mel desta verdade. Assim é esta pessoa brilhante e imortal nesta verdade, e esta pessoa brilhante e imortal que existe como a verdade no corpo, (ambas são madhu). Ela, de facto, é o mesmo que aquele Ser, aquele Imortal, aquele Brahman, aquele Tudo.

13. Esta humanidade é o mel de todos os seres, e todos os seres são o mel desta humanidade. Assim é esta pessoa brilhante e imortal nesta humanidade, e esta pessoa brilhante e imortal que existe como homem no corpo, (ambas são madhu). Ela, de facto, é o mesmo que aquele Ser, aquele Imortal, aquele Brahman, aquele Tudo.

14. Este Ser é o mel de todos os seres, e todos os seres são o mel deste Ser. Assim é esta pessoa brilhante e imortal neste Ser, e esta pessoa brilhante e imortal, o Ser (ambas são madhu). Ela, de facto, é o mesmo que aquele Ser, aquele Imortal, aquele Brahman, aquele Tudo.

15. E este Ser é, de facto, o senhor de todos os seres, o rei de todos os seres. E tal como todos os raios estão no eixo e na (felly?) de uma roda, todos os seres, e todos aqueles Seres (da Terra, água, etc.) estão contidos naquele Ser.

16. Na verdade, Dadhyak Atharvana proclamou este mel (o madhu-vidya) aos dois Asvins, e um Rishi, ao ver isto, disse (Rv. I, 116, 12):
‘Oh, vós, dois herois (Asvins), eu torno manifesta aquela vossa terrível façanha (que realizasteis) para o vosso enriquecimento’, da mesma forma que o trovão torna manifesta a chuva. O mel (madhu-vidya) que Dadhyak Atharvana te proclamou através da cabeça de um cavalo,’...

17. De facto, Dadhyak Atharvana proclamou este mel aos dois Asvins, e um Rishi, vendo isto, disse (Rv. I, 117, 22):
‘Oh, Asvins, vós colocasteis uma cabeça de cavalo no Atharvana Dadhyak, e ele, querendo ser fiel (à sua promessa), proclamou-te o mel, tanto o de Tvashiri, como aquele que deve ser o teu segredo, oh, vós, poderosos.

18. Na verdade, Atharvana Dadhyak proclamou o seu mel aos dois Asvins, e um Rishi, vendo isto, disse:
‘Ele (o Senhor) fez corpos com dois pés, ele fez corpos com dois pés. Tendo-se primeiro tornado num pássaro, ele entrou nos corpos como purusha (como a pessoa)’. Este mesmo purusha é em todos os corpos o purisaya, i.e. aquele que está no corpo (e é, portanto, chamado purusha). Não há nada que não seja coberto por ele, nada que não seja preenchido por ele.

19. Na verdade, Atharvana Dadhyak proclamou o seu mel aos dois Asvins, e um Rishi, vendo isto, disse (Rv. VI, 47, 18):
‘Ele (o Senhor) ficou como estando dentro de todas as formas e isto é suposto revelar a (verdadeira) forma dele (o Atman). Indra (o Senhor) aparece em muitas formas através dos mayas (aparências), pois os seus cavalos (sentidos) estão subjugados, centenas e dez’.
Este (Atman) é os cavalos, este (Atman) é os dez, e os milhares, muitos e inúmeros sem limite. Isto é Brahman, sem causa e sem efeito, sem nada dentro ou fora; este Ser é Brahman, omnipresente e omnisciente. Este é o ensinamento (dos Upanishads).






QUARTO ADHYAYA - QUINTO BRAHMANA

1. Yagnavalkya tinha duas esposas, Maitreyi e Katyayani. Destas Maitreyi era chegada a Brahman, mas Katyayani possuia apenas aquele conhecimento que as mulheres possuem. E Yagnavalkya, quando desejou ficar preparado para um outro estado de vida (quando quis abandonar o estado de chefe de família, e retirar-se para a floresta),

2. Disse, ‘Maitreyi, na verdade, eu vou-me embora desta minha casa (para o interior da floresta). Assim, deixai-me fazer um acordo entre vós e essa Katyayani’.

3. Maitreyi disse: ‘Meu Senhor, se toda esta Terra, cheia de riqueza, me pertencesse, dizei-me, deveria eu ser imortal por causa disso ou não?’
‘Não’, respondeu Yagnavalkya, ‘como a vida das pessoas ricas será a vossa vida. Mas não há esperança de imortalidade na riqueza material.’

4. E Maitreyi disse, ‘Que posso eu fazer com aquilo através do que não me torno imortal? Dizei-me, meu Senhor, o que sabeis (sobre a imortalidade), dizei-mo de forma clara.’

5. Yagnavalkya respondeu: ‘Vós, que me sois verdadeiramente querida, aumentasteis o que (me) é querido (em vós). Portanto, se quereis, Senhora, explicar-vos-ei, e tomai devida nota do que eu digo’.

6. E ele disse: ‘Na verdade, um marido não é querido, por ser amado como marido; mas é por se amar o Ser que um marido é querido.
‘Na verdade, uma esposa não é querida, por ser amada como esposa; mas é por se amar o Ser que uma esposa é querida.
‘Na verdade, os filhos não são queridos, por serem amados como filhos; mas é por se amar o Ser que os filhos são queridos.
‘Na verdade, a riqueza material não é querida, por ser amada como riqueza material; mas é por se amar o Ser que a riqueza material é querida.
‘Na verdade, o gado não é querido, por ser amado como gado; mas é por se amar o Ser que o gado é querido.
‘Na verdade, a casta dos Brahmanes não é querida, por ser amada como casta de Brahmanes; mas é por se amar o Ser que a casta dos Brahmanes é querida.
‘Na verdade, a casta dos kshatryas não é querida, por ser amada como casta dos kshatryas; mas é por se amar o Ser que a casta dos kshatryas é querida.
‘Na verdade, os mundos não são queridos, por serem amados como mundos; mas é por se amar o Ser que os mundos são queridos.
‘Na verdade, os Devas não são queridos, por serem amados como Devas; mas é por se amar o Ser que os Devas são queridos.
‘Na verdade, os Vedas não são queridos, por serem amados como os Vedas; mas é por se amar o Ser que os Vedas são queridos.
‘Na verdade, as criaturas não são queridas, por serem amadas como criaturas; mas é por se amar o Ser que as criaturas são queridas.
‘Na verdade, tudo não é querido, por ser amado como tudo; mas é por se amar o Ser que tudo é querido.
‘Na verdade o Ser é para ser visto, para ser ouvido, para ser percebido, para ser marcado, oh, Maitreyi! Quando tivermos visto, ouvido, percebido, e conhecido o Ser, então tudo isto será conhecido’.

7.‘Quem quer que procure a casta dos Brahmanes em qualquer outro lugar que não seja o Ser, foi abandonado pela casta dos Brahmanes. Quem quer que procure a casta dos Kshatrya em qualquer outro lugar que não seja o Ser, foi abandonado pela casta dos Kshatrya. Quem quer que procure os mundos em qualquer outro lugar que não seja o Ser, foi abandonado pelos mundos. Quem quer que procure os Devas em qualquer outro lugar que não seja o Ser, foi abandonado pelos Devas. Quem quer que procure os Vedas em qualquer outro lugar que não seja o Ser, foi abandonado pelos Vedas. Quem quer que procure as criaturas em qualquer outro lugar que não seja o Ser, foi abandonado pelas criaturas. Quem quer que procure alguma coisa em qualquer outro lugar que não seja o Ser, foi abandonado por tudo.
‘Esta casta dos Brahmanes, esta casta dos kshatryas, estes mundos, estes Devas, estes Vedas, estes seres, este tudo, tudo é esse Ser’.

8. Agora, como os sons de um tambor, quando tocado, não podem ser medidos exteriormente (por eles próprios), sendo antes o som medido, medindo o tambor, ou através do tocador do tambor;’

9. ‘E tal como os sons de uma concha, quando soprada, não podem ser medidos exteriormente (por eles próprios), sendo antes o som medido, medindo a concha, ou através do tocador da concha;’

10. ‘E tal como os sons de um alaúde, quando tocado, não podem ser medidos exteriormente (por eles próprios), sendo antes o som medido, medindo o alaúde, ou através do tocador de alaúde;’

11.‘Como nuvens de fumo, que se sucedem vindas de um fogo ateado com combustível húmido, também, na verdade, oh, Maitreyi, foi soprado a partir deste grande Ser o que temos como Rig-Veda, Yagur-veda, Sama-veda, Atharvangirasas, Itihasa, Purana, Vidya, os Upanishads, Slokas, Sutras, Anuvyakhyanas, Vyakhyanas, o que é sacrificado, o que é vertido, a comida, a bebida, este mundo e o outro mundo, e todas as criaturas. Dele apenas todos estes foram soprados’.

12. Tal como todas as águas encontram o seu centro no mar, todos os toques, na pele, todos os gostos, na língua, todos os cheiros, no nariz, todas as cores, nos olhos, todos os sons, nos ouvidos, tudo o que é percebido, na mente, todo o conhecimento, no coração, todas as acções, nas mãos, todos os movimentos, nos pés, e todos os Vedas na fala,

13. Tal como uma grande quantidade de sal não tem interior nem exterior, mas é, no seu todo, uma massa (grande quantidade) de gosto, assim também esse Ser não tem, de facto, interior ou exterior, mas é, no seu todo, uma massa (grande quantidade) de conhecimento; e, tendo-se erguido a partir destes elementos, desaparece de novo neles. Quando a mentira tiver partido, não haverá mais conhecimento (nome), digo Eu, oh, Maitreyi,’- assim falou Yagnavalkya.

14. Então Maitreyi disse: ‘Aqui, Senhor, vós colocasteis-me numa grande confusão. De facto, não vos compreendo.’
Mas ele respondeu: ‘Oh, Maitreyi, eu não digo nada que cause confusão. Na verdade, amado, esse Ser é imperecível, e de uma natureza indestrutível.

15. Porque quando existe dualidade, então vemos o outro, cheiramos o outro, provamos o outro, saudamos o outro, ouvimos o outro, percebemos o outro, tocamos no outro, conhecemos o outro; mas quando só o Ser é tudo isto, como poderia ver um outro, como poderia cheirar um outro, como poderia provar um outro, como poderia saudar um outro, como poderia ouvir um outro, como poderia tocar num outro, como poderia conhecer um outro? Como é que poderia conhecer Aquele pelo qual conhece tudo isto? Esse Ser deve ser descrito através de (negação) não, não! Ele é incompreensível, pois não pode ser compreendido; ele é imperecível, pois não pode perecer; ele é desprendido, pois não se prende a nada; solto (liberto), ele não sofre, não falha. Como, oh, amado, poderia ele conhecer o Conhecedor? Assim, oh, Maitreyi, foste instruída. É até onde vai a imortalidade’. Tendo assim falado, Yagnavalkya foi-se embora (para a floresta).







QUARTO ADHYAYA - TERCEIRO BRAHMANA

1. Yagnavalkya foi ter com Ganaka Vaideha, e não tinha a intenção de falar com ele. Mas quando, anteriormente, Ganaka Vaideha e Yagnavalkya tiveram uma disputa sobre o Agnihotra, Yagnavalkya concedeu-lhe um desejo, e ele escolheu a possibilidade de lhe colocar livremente qualquer questão à sua escolha. Yagnavalkya deu-lhe essa possibilidade e, assim, o Rei foi o primeiro a colocar-lhe uma questão.

2. ‘Yagnavalkya’, disse ele, ‘qual é a luz do homem?’
Yagnavalkya respondeu: ‘O sol, oh, Rei; porque, tendo apenas o sol como sua luz, o homem senta-se, movimenta-se, faz o seu trabalho, e regressa’.
Ganaka Vaideha disse: ‘Assim é, de facto, oh, Yagnavalkya’.

3. Ganaka Vaideha disse: ‘Quando o sol se pôs, oh, Yagnavalkya, qual é, então, a luz do homem?’
Yagnavalkya respondeu: ‘Então, é, de facto, a lua a sua luz; porque, tendo apenas a lua como sua luz, o homem senta-se, movimenta-se, faz o seu trabalho, e regressa’.
Ganaka Vaideha disse: ‘Assim é, de facto, oh, Yagnavalkya’.

4. Ganaka Vaideha disse: ‘Quando o sol se pôs, oh, Yagnavalkya, e a lua desapareceu, qual é a luz do homem?’
Yagnavalkya respondeu: ‘Na realidade, o fogo é a sua luz; porque, tendo apenas o fogo como sua luz, o homem senta-se, movimenta-se, faz o seu trabalho, e regressa’.

5. Ganaka Vaideha disse: ‘Quando o sol se pôs, oh, Yagnavalkya, e a lua desapareceu, e o fogo se foi embora, qual é então a luz do homem?’
Yagnavalkya respondeu: ‘O som é, de facto, a sua luz; porque, tendo apenas o som como sua luz, o homem senta-se, movimenta-se, faz o seu trabalho, e regressa’. Portanto, oh, Rei, quando não conseguimos ver nem mesmo a nossa própria mão, apesar disso, quando surge um som, vamos na sua direcção’.
Ganaka Vaideha disse: ‘Assim é, de facto, oh, Yagnavalkya’.

6. Ganaka Vaideha disse: ‘Quando o sol se pôs, oh, Yagnavalkya, e a lua desapareceu, e o fogo se foi embora, e o som se silenciou, qual é então a luz do homem?’
Yagnavalkya disse: ‘O Ser é, de verdade, a luz; porque, tendo apenas o Ser como sua luz, o homem senta-se, movimenta-se, faz o seu trabalho, e regressa’.

7. Ganaka Vaideha disse: ‘Quem é esse Ser?'
Yagnavalkya respondeu: ‘Ele, que está dentro do coração, envolto pelos Pranas (sentidos), a pessoa de luz, que consiste em conhecimento. Ele, permanecendo o mesmo, vagueia pelos dois mundos, como se estivesse a pensar, como se estivesse a mover-se. Durante o sono ele transcende este mundo e todas as formas de morte (tudo o que cai sob o domínio da morte, tudo o que é perecível).’

8. ‘Ao nascer como essa pessoa, assumindo o seu corpo, torna-se unido a todos os males; quando parte e morre, ele deixa todos os males para trás.

9. ‘E há dois estados para essa pessoa, o que fica aqui neste mundo, o outro no outro mundo, e, como terceiro, um estado intermédio, o estado de sono. Quando nesse estado intermédio, ele vê ambos aqueles estados ao mesmo tempo, o que fica aqui neste mundo e o outro no outro mundo. Assim, qualquer que possa ser a sua admissão ao outro mundo, uma vez que a tenha conseguido, ele vê tanto os males como as bênçãos.
‘E quando adormece, então, depois de levar consigo o material deste mundo, destruindo-o e construindo-o de novo, ele dorme com a sua própria luz. Nesse estado a pessoa é auto-iluminada..

10. Nesse estado não há quadrigas, nem cavalos, nem estradas, mas é ele próprio que faz surgir (cria) quadrigas, cavalos e estradas. Lá não há bênçãos, nem felicidade nem alegrias, mas é ele próprio que faz surgir bênçãos, felicidade e alegrias. Lá não há tanques de água, nem lagos, nem rios, mas é ele próprio que faz surgir tanques de água, lagos e rios. Ele é, de facto, um fazedor.

11. ‘Sobre isto, há estes versos:
‘Depois de ter subjugado, pelo sono, tudo o que pertence ao corpo, ele, não estando ele próprio a dormir, olha para baixo para os (sentidos) que dormem. Tendo assumido a luz, ele vai de novo para o seu lugar, a pessoa dourada, o pássaro solitário. (1)

12. ‘Guardando com o sopro (respiração, vida) o ninho a baixo, o imortal move-se e deixa o ninho; esse que é imortal vai para onde quiser, a pessoa dourada, o pássaro solitário. (2)
13. Andando para cima e para baixo no seu sonho, o deus cria para ele formas múltiplas, tanto deleitando-se na companhia de mulheres, como rindo (com os seus amigos), como tendo terríveis visões.’ (3)

14. ‘As pessoas podem ver o seu local de recreio, mas ele próprio, nunca ninguém o vê. Por isso se diz: “nunca se a
corde um homem de repente, pois não é fácil remediar quando ele não regressa”
‘Aqui algumas pessoas objectam e dizem: Não, este (sono) é o mesmo que o lugar em que se acorda, porque o que ele vê enquanto está acordado, apenas isso ele vê quando dorme”.
Não, aqui (no sono) a pessoa é auto-iluminada (como explicámos antes)’.
Ganaka Vaideha disse: ‘Eu dou-vos, Senhor, mil. Falai, a bem da (minha) emancipação’.

15.Yagnavalkya disse: Essa (pessoa), tendo desfrutado naquele estado de bem-aventurança (samprasada, sono profundo), tendo-se movimentado e tendo visto tanto bem como mal, apressa-se a regressar, tal como veio, ao lugar a partir do qual começou (o lugar do sono), ao sonho. E o que quer que tenha lá visto, ele não é seguido (afectado) por isso, porque essa pessoa não está ligada (presa) a nada’.
Ganaka Vaideha disse: ‘Assim é, de facto, Yagnavalkya. Eu dou-vos, Senhor, mil. Falai, a bem da (minha) emancipação’.

16. Yagnavalkya disse: Essa (pessoa), tendo desfrutado naquele estado de bem-aventurança (sonho), tendo-se movimentado e tendo visto tanto bem como mal, apressa-se a regressar, tal como veio, ao lugar a partir do qual começou, para ficar acordado. E o que quer que tenha lá visto, ele não é seguido (afectado) por isso, porque essa pessoa não está ligada (presa) a nada’.
Ganaka Vaideha disse: ‘Assim é, de facto, Yagnavalkya. Eu dou-vos, Senhor, mil. Falai, a bem da (minha) emancipação’.

17.Yagnavalkya disse: ‘Essa (pessoa), tendo desfrutado naquele estado de vigília, tendo-se movimentado e tendo visto tanto bem como mal, apressa-se a regressar, tal como veio, ao lugar a partir do qual começou, para o estado de sono.

18. ‘De facto, tal como um grande peixe se movimenta nos dois lados de um rio, o direito e o esquerdo, também aquela pessoa se movimenta nestes dois estados, o estado de sono e o estado de vigília.

19. ‘E, como um falcão, ou qualquer outro pássaro (veloz), depois de ter vagueado aqui no céu, fica cansado, e, dobrando as asas, é levado para o seu ninho, também essa pessoa se apressa a regressar a esse estado em que, quando a dormir, não deseja mais desejos, e não sonha mais sonhos.

20. ‘Há no seu corpo as veias chamadas Hita, que são tão pequenas como um cabelo dividido em mil, cheio de branco, azul, amarelo, verde e vermelho. ’Assim, quando, aparentemente, o matam, aparentemente, o ultrapassam, aparentemente, um elefante o persegue, aparentemente, cai num poço, ele imagina, devido à ignorância, esse perigo que ele vê (normalmente) na vigília. Mas quando ele imagina que é, aparentemente, um deus, ou que é, aparentemente, um rei, ou “eu sou isto tudo”, esse é o mundo mais alto.

21. ‘Esta é, de facto, a (verdadeira) forma, livre de desejos, livre do mal, livre do medo. Assim, como um homem, abraçado por uma amada esposa, não sabe nada do que está fora (sem), nada do que está dentro (com), também esta pessoa, quando abraçada pelo inteligente (prana) Ser, nada sabe do que está fora (sem), nada do que está dentro (com). Esta é, de facto, a (verdadeira) forma, na qual os seus desejos são realizados, na qual (apenas) o Ser é o seu desejo, na qual nenhum desejo resta, - livre de toda a dor.

22. Então, um pai não é um pai, uma mãe não é uma mãe, os mundos não são mundos, os deuses não são deuses, os Vedas não são Vedas. Então, um ladrão não é um ladrão, um assassino não é um assassino, um Kandala não é um Kandala, um Paulkasa não é um Paulkasa, um Sramana não é um Sramana, um Tapasa não é um Tapasa. Ele não é seguido pelo bem, não é seguido pelo mal, porque ele ultrapassou, então, todas as penas do coração.

23. 'E quando (se diz que) lá (no Sushupti) ele não vê, apesar de estar a ver, embora não veja. Porque a vista é inseparável daquele que vê, pois não pode perecer. Mas não há um segundo, nada para além dele próprio, que ele pudesse ver.

24. 'E quando (se diz que) lá (no Sushupti) ele não cheira, apesar de estar a cheirar, embora não cheire. Porque o cheiro é inseparável daquele que cheira, pois não pode perecer. Mas não há um segundo, nada para além dele próprio, que ele pudesse cheirar.

25. 'E quando (se diz que) lá (no Sushupti) ele não prova, apesar de estar a provar, embora não prove. Porque o paladar é inseparável daquele que prova, pois não pode perecer. Mas não há um segundo, nada para além dele próprio, que ele pudesse provar.

26. 'E quando (se diz que) lá (no Sushupti) ele não fala, apesar de estar a falar, embora não fale. Porque a fala é inseparável daquele que fala, pois não pode perecer. Mas não há um segundo, nada para além dele próprio, que ele pudesse falar.

27. 'E quando (se diz que) lá (no Sushupti) ele não ouve, apesar de estar a ouvir, embora não ouça. Porque a audição é inseparável daquele que ouve, pois não pode perecer. Mas não há um segundo, nada para além dele próprio, que ele pudesse ouvir.

28. 'E quando (se diz que) lá (no Sushupti) ele não pensa, apesar de estar a pensar, embora não pense. Porque o pensamento é inseparável daquele que pensa, pois não pode perecer. Mas não há um segundo, nada para além dele próprio, que ele pudesse pensar.

29. 'E quando (se diz que) lá (no Sushupti) ele não toca, apesar de estar a tocar, embora não toque. Porque o tacto é inseparável daquele que toca, pois não pode perecer. Mas não há um segundo, nada para além dele próprio, que ele pudesse tocar.

30. 'E quando (se diz que) lá (no Sushupti) ele não conhece, apesar de estar a conhecer, embora não conheça. Porque o conhecimento é inseparável daquele que conhece, pois não pode perecer. Mas não há um segundo, nada para além dele próprio, que ele pudesse conhecer.

31. ‘Quando (na vigília e no sonho) há, aparentemente, um outro, então podemos ver o outro, então podemos cheirar o outro, então podemos falar com o outro, então podemos ouvir o outro, então podemos pensar o outro, então podemos tocar no outro, então podemos conhecer o outro.

32. 'Um oceano, é aquele que vê, sem qualquer dualidade; este é o mundo-de-Brahman, oh, Rei.' Assim lhe ensinou Yagiiavalkya. Esta é a meta mais alta, este é o maior sucesso, este é o mundo mais elevado, esta é a sua maior bem-aventurança. Todas as outras criaturas vivem numa pequena porção dessa bem-aventurança.

33. 'Se um homem é saudável, rico, e senhor de outros, rodeado de todos os prazeres humanos, essa é a mais alta bênção dos homens. Então, cem destas bênçãos humanas fazem uma bênção dos pais que conquistaram o mundo (dos pais). Cem bênçãos dos pais que conquistaram este mundo fazem uma bênção no mundo do Gandharva. Cem bênçãos no mundo do Gandharva fazem uma bênção dos Devas por mérito (trabalho, sacrifício), que obtêm a sua cabeça de deus por mérito. Cem bênçãos dos Devas por mérito fazem uma bênção dos Devas por nascimento, também (de) um Srotriya que é livre de pecado, e não dominado pelo desejo. Cem bênçãos dos Devas por nascimento fazem uma bênção no mundo de Pragapati, também (de) um Srotriya que é livre de pecado, e não dominado pelo desejo. Cem bênçãos no mundo de Pragapati fazem uma bênção no mundo-de-Brahman, também (de) um Srotriya que é livre de pecado, e não dominado pelo desejo. E esta é a bênção mais alta.
'Este é o mundo-de-Brahma, oh, Rei,' Assim falou Yagnavalkya.
Ganaka Vaideha disse: 'Eu dou-vos, Senhor, mil. Falai, a bem da (minha) emancipação.'
Então Yagnavalkya receou que o Rei, tendo ficado cheio de entendimento, fosse levado a abandonar todas as suas posições.

34. E Yagnavalkya disse: ‘Essa (pessoa), tendo desfrutado naquele estado de sono, tendo-se movimentado e visto o bem e o mal, apressa-se a regressar de novo, tal como veio, ao lugar donde começou, ao estado de vigília.

35. 'Então, tal como uma carruagem muito carregada se desloca a ranger, também este Ser corpóreo, montado pelo Ser inteligente, se desloca a ranger, quando um homem vai expirar (morrer).

36. E quando (o corpo) fica fraco com a idade avançada, ou fica fraco com a doença, nessa altura, essa pessoa, depois de se separar dos seus membros, como uma Amra (manga), ou Udumbara (figo), ou fruta-Pippala, é separada do seu pé (talo), apressa-se a regressar de novo, tal como veio, ao local donde começou, para uma (nova) vida.

37. E como os polícias, magistrados, intendentes das cavalariças e governadores esperam por um rei que vai regressar, com comida e bebida, dizendo, "Ele está a voltar, está a aproximar-se," assim também todos os elementos esperam por aquele que sabe isto, dizendo, "Aquele Brahman está a vir, aquele Brahman está a aproximar-se."

38. ' E como os polícias, magistrados, intendentes das cavalariças e governadores se juntam em volta de um rei que vai partir, também todos os sentidos (pranas) se juntam em redor do Ser na altura da morte, quando um homem vai expirar (morrer).’